Faz mais de 20 anos que a médica Ana Claudia Quintana Arantes lida profissionalmente com a morte. Em 2012, ela deu uma palestra no TED falando sobre seu trabalho como geriatra e paliativista e o vídeo viralizou. Sua fala virou um livro publicado em 2016 e ampliado em 2019. Em A morte é um dia que vale a pena viver: E um excelente motivo para se buscar um novo olhar para a vida (Editora Sextante, 192 páginas), a autora quebra tabus e se debruça sobre um assunto que a maioria prefere evitar: a morte.
Com mais de 300 mil livros vendidos, ela prova que discutir o fim da vida é uma necessidade não só pessoal, mas de saúde pública. Uma das maiores referências em cuidado paliativo no país, a especialista mostra que ainda há muito a se fazer pelos pacientes, mesmo quando não existem mais chances de cura, que a medicina pode ir além dos tratamentos e medicamentos.
Ana Cláudia é formada pela USP e sócia-fundadora da Associação Casa do Cuidar, que oferece formação multiprofissional em cuidados paliativos. Na primeira obra, ela conta um pouco de sua jornada pessoal como médica, e ao modelo de Dráuzio Varella, mostra que é possível exercer os dois cargos, na medicina e na escrita, com maestria. Além de escrever muito bem, ela aborda a finitude da vida humana de forma inesperada, fazendo o leitor refletir sobre sua própria existência, e sobre o fim que ganham as pessoas que amamos. Será que não poderíamos estar fazendo mais por elas?
O livro destaca a evolução dos cuidados com as pessoas perto da morte. A conclusão a que chegamos após a leitura, não pode ser outra: a médica que convive com a morte diariamente realça que o que deveria nos apavorar e preocupar não é chegar ao nosso fim, mas sim a perspectiva de morrer sem antes ter aproveitado as oportunidades, sem ter utilizado o tempo como queríamos, enfim, de não ter realmente vivido.
A reflexão dá vida também ao seu segundo livro, Histórias lindas de morrer (Editora Sextante, 224 páginas), de 2020. No volume, a paliativista relata momentos que passou no atendimento aos pacientes, e sem identificá-los, compartilha suas jornadas de doença, dor, sofrimento, beleza, amor e redenção. As relações familiares que sofrem ao longo da vida e no leito de morte conseguem encontrar um caminho, os arrependimentos e as alegrias, tudo que nos faz ser humanos, e que importa mais a cada dia que passamos na terra.
É impossível não se emocionar durante as duas leituras, não encontrar histórias familiares, não se ver na jornada dessas pessoas e no medo ou na coragem com o qual elas encontram seu perecimento. O livro também compartilha a importância que a medicina tem ao oferecer conforto quando leva em consideração a pessoa humana, além do caso clínico. Em muitos casos, seguir o tratamento pode causar ainda mais dor, e por mais que seja difícil abrir mão de uma esperança de melhorar, oferecer cuidados e alívio, pode ser ainda mais importante.
A médica escreveu ainda Pra vida toda valer a pena viver: Pequeno manual para envelhecer com alegria (2021), também pela Editora Sextante. Na obra ela também dá dicas de saúde e bem-estar para chegar melhor à terceira idade. Não tive a oportunidade de ler, mas já está na minha lista de leituras, então assim que conseguir conferir volto aqui para contar o que achei. Mas uma coisa é certa: terá uma escrita ricamente humana, emocionante e capaz de mudar a vida de quem lê.
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