Colunista

Paola Severo

Retalhos de poesia

O adeus a Edna O’Brien

Publicado em: 02 de agosto de 2024 às 07:51 Atualizado em: 02 de agosto de 2024 às 07:52
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Escritora irlandesa faleceu no último fim de semana e para relembrar seu legado indico o livro A Luz da Noite

Nesse eu espaço eu sempre trago algumas dicas de leitura, mas hoje junto com a minha dica não poderia deixar de comentar um acontecimento triste. Faleceu no último fim de semana a escritora irlandesa Edna O’Brien. A autora conhecida pela sua literatura rebelde e feminista, teve o falecimento aos 93 anos anunciado pela sua editora. A causa não foi divulgada, mas a nota informava que ela havia morrido tranquilamente após uma longa doença.

A premiada autora escreveu, além dos romances, também peças de teatro e contos. Uma das maiores escritoras do último século, Edna O’Brien revolucionou a literatura irlandesa, escrevendo sobre a vida das mulheres em uma prosa simples, mas que captava a condição humana. Sua coragem moral para enfrentar o conservadorismo de seu país foi a marca de seu trabalho.

Seu primeiro romance, “The Country Girls” (1960), sobre a iniciação sexual de meninas católicas, baseado em sua experiência pessoal, foi um marco por romper tabus sociais. A obra chegou a ser banida de livrarias de Dublin e queimada, e o mesmo ocorreu com seus seis livros seguintes. Muitos leitores não suportavam o fato de O’Brien representar o próprio país como um local violento, atrasado e onde as mulheres eram tratadas de forma repressiva e medieval.

Minha última leitura do ano de 2023 foi o livro dela A luz da noite, de 2006 (Editora Record, 384 páginas). Na obra que retrata uma complexa relação de mãe e filha, Edna O’Brien explora a vida de Dilly, que aos 78 anos e internada no hospital, aguarda a visita da filha Eleanora. Nas páginas somos apresentados à vida dos camponeses irlandeses, seu cotidiano, suas preocupações.

Na cama do hospital, Dilly relembra sua viagem para os Estados Unidos na década de 1920, onde viveu o primeiro amor e o regresso à terra natal. Nesse momento de reminiscências e vulnerabilidade, recebe uma visita rápida da filha, que é uma famosa escritora e vive na cidade grande, longe da comunidade onde nasceu. Na visita, Eleanora esquece se diário no quarto da mãe, e a leitura dele revelará os verdadeiros sentimentos que elas tem uma pela outra, mudando o rumo da vida dessas duas personagens.

Confesso que no início achei que o livro seria arrastado, seu estilo cru e direto contrasta com suas paisagens idílicas no interior rural.No entanto a forma como a escritora constrói suas personagens, em especial as mulheres, termina por captar totalmente a atenção do leitor. Soma-se a isso as picuinhas e dramas no estremecimento dos laços familiares, o peso de todas as palavras não ditas, dos arrependimentos e contendas do passado, e a voz interna de Dilly com a qual nos conectamos ao longo dos capítulos, e o resultado é uma obra riquissima.

A Luz da Noite nos permite entender um pouco sobre a realidade social da irlanda, mas especialmente, experienciar um pouco do que é ser mulher em qualquer lugar. Uma leitura de muito valor.