Carmen Kappel relembra a paixão da filha pela BM e a coragem com a qual enfrentava os dias
Na segunda-feira, uma forte dor tomou conta do coração de Carmen Lucia Kappel. Aquele aperto e aquela angústia iniciaram pela manhã e persistiram até as 18h, quando a notícia da morte da filha chegou e a fez desabar em lágrimas. No velório na terça-feira, ao lado de familiares e colegas da filha do Pelotão de Operações Especiais (POE), que Marciele Alves se orgulhava de fazer parte, a mãe se despediu e a viu ser sepultada com a farda que honrou por sete anos. Trajetória interrompida durante um confronto no Vale do Taquari, quando a jovem de 28 anos foi atropelada por criminosos que não respeitaram a barreira policial.
E é essa Marciele, forte, corajosa e destemida, que fica no coração da mãe. Afinal, Carmen tem certeza: a filha morreu ao fazer o que amava. “Um dia perguntei de onde ela tirava tanta coragem e ela respondeu: ‘de ti, mãe’”. Ela foi uma profissional exemplar. Policial, negra, fisioterapeuta. Era assim que ela queria ser reconhecida. Tinha planos de ser delegada. Queria me dar ainda mais orgulho. Só tenho a agradecer por ela ter me escolhido como mãe”, diz.
“Não foi em vão”
Por mais dolorido que seja não poder estar mais com a filha, Carmen sabe que o propósito da jovem, de proteger e cuidar a sociedade, foi cumprido e que Marciele, se pudesse escolher, viveria tudo de novo, sem alterações. “Agora mais uma policial se vai e nada é feito, mas a tua morte não foi em vão. Filha, te amo e te amarei sempre. Me ajuda com essa dor horrível. Meu exemplo, minha mulher maravilha. Que Deus te receba de braços abertos. Meu pai, cuida dela para mim. Rezem para ela ter muita luz”, destacou em uma postagem nas redes sociais.
Agora, restam as lembranças. Os momentos felizes que passou, nestas quase três décadas, ao lado da filha, primeiro em Cachoeira do Sul e depois em Santa Cruz do Sul. Marciele, conforme Carmen, gostava de aproveitar a vida intensamente. “Ela tinha planos de me levar para viajar no final do ano. ‘Vamos viajar o mundo todo’, dizia. Mas, não deu. A Marciele me mostrou que dinheiro não é tudo e que guardá-lo não leva a nada. Me ensinou a doar sem esperar receber algo em troca e que não devemos programar tudo, mas fazer o que vem em nossa mente. Me disse para estudar, mas não muito, apenas o suficiente para ser independente e crescer. Queria me ver formada, uma grande enfermeira, mas não consegui fazer o desejo dela em tempo. Ela se preocupava com todos, amava se vestir bem e tirar fotos, de preferência fardada”, lembra com saudade.
Ela queria proteger
Dedicada e estudiosa, a menina sempre gostou de se divertir e aprender. Segundo a mãe, o que ela preferia eram as brincadeiras de luta. Desde pequena se dividia em desejar a fisioterapia, o futebol, a enfermagem e o ramo policial. Mas seu instinto de proteção e defesa sempre deixou claro, aos familiares, que ela havia nascido para cuidar da segurança dos demais. "Principalmente as mulheres”, destaca Carmen, sobre quem a Marciele gostava de proteger. Mulher de personalidade forte e com um coração gigante, a jovem sabia que, ao se fardar, poderia fazer a diferença, cuidando daqueles que mais precisam. Indo para a rua e lutando, não somente contra o crime, mas a favor de causas que ela acreditava.
Ao saber que ela estava sempre em lutas, não mais nas de brincadeira no conforto de casa, o coração de Carmen sempre acelerava ao ver uma viatura passando ou ao escutar uma sirene. Sempre na expectativa de que ela chegasse bem em casa e sempre com o medo da pior notícia. Aquela que recebeu na última segunda-feira e que todo o Rio Grande do Sul desejou que que não fosse verdade.
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