Colunista

Daniel Cruz

Fazer ComPaixão

Coelho não põe ovo

Publicado em: 20 de abril de 2025 às 09:32
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Páscoa é renascimento e pensando bem poderia e deveria ser todo dia. Novas coisas para que apareçam na nossa vida requerem que velhas coisas sejam deixadas

Datas comemorativas são sempre recheadas de simbolismos e geralmente acompanhadas de pedidos e promessas de um mundo e uma vida melhor. Na minha percepção Páscoa sempre foi a mais simbólica e mística pois se o nascimento de Jesus já foi algo surreal, sua ressurreição transcende a capacidade de entendimento do ser humano e nos faz não apenas entender como viver algo a que chamamos de fé.

Hoje é um dia daqueles em que milhares de mensagens se espalham pelo mundo como se o marco zero, da verdadeira mudança de comportamento  e entendimento da vida passasse a vigorar a partir das 12 badaladas do relógio na passagem do sábado para domingo. A emoção toma conta de todos e entre chocolates e abraços percebemos que é possível melhorar mas talvez não saibamos como fazer.

Sempre falo que não basta conhecer e pregar a palavra pois se não a vivermos de nada terá valido o tempo empreendido no processo. As vezes fico olhando algumas premissas que nos colocam para que o Grande Criador realmente viva em nossos corações. Confesso que algumas lembranças da infância são bem vivas e hoje me fazem rir pois não consigo entender o por quê?

Lembro que ir à missa com bermuda e camisetas com cores vivas não era coisa legal, bem como, e isso escutei dias atrás, a missa da sexta a tardinha não “valeria” para a semana seguinte. Longe de criticar, mas fico pensando a relação de vestimenta, fé, bem como o prazo de validade e a constante necessidade de renovação da mesma. Fico pensando o quanto acreditamos nas nossas crenças e o quanto elas acabam por ditar padrões de comportamento.

A fé evoluiu e percebo que, a exemplo de muitas coisas, foi envelopada e virou um produto a ser “ vendido”, inclusive no mundo digital. Hoje, um pouco mais maduro, percebo que a verdadeira igreja não é aquela de pedra e sim o nosso interior. A verdadeira casa do Senhor está no meu interior e, portanto, aberta 24h e pronta para contemplar e ser contemplada a cada momento.

A Páscoa que hoje celebramos vem recheada de aspectos que muito me levam a pensar no meu dia-a-dia. Me pergunto se, a exemplo de Jesus, eu morreria por outro? Me pergunto se, a exemplo dos povos daquela época, conseguiria mandar soltar o ladrão ao invés do Salvador? Me pergunto o quanto sou capaz de perdoar e qual a verdadeira distância, sob esse aspecto, entre a minha fala e as minhas ações.

O momento requer profunda reflexão, talvez por isso a abstinência vivenciada da Sexta-feira Santa que, na minha percepção, virou outro comércio pois ao invés de nos recolhermos à simplicidade “gourmetizamos” a data com um show de lindos pratos e bebidas de alta qualidade.

Talvez a maior abstinência seja a de praticar o silêncio e a introspecção. Lembro que nas rádios, nessas datas, apenas músicas orquestradas e calmas eram tocadas. Quaresma era período de profunda reflexão, sem grandes festejos e hoje até mesmo as comunidades das igrejas fazem bailes no período. Entendo que não há problema algum quanto a isso mas percebo uma necessidade de ajuste e coerência com aquilo que é pregado.

O Criador é único, maior que qualquer entidade representativa e isso me leva a perceber que muitas das guerras que hoje o mundo vivencia estão relacionadas com disputas religiosas e demonstram o quanto precisamos evoluir. Não se trata de quem é melhor, quem tem a verdadeira verdade e sim de fazermos o nosso melhor de maneira verdadeira.

Muitas vezes a verdade dói pois ela aponta nossas falhas mas “…que atire a primeira pedra que não nunca pecou…”. Por muito tempo, e assim fui ensinado, entendi que errar é humano e perdoar é Divino. Hoje, discordo tranquilamente, pois percebo que a culpa pode até estar no outro mas o perdão estará sempre na gente. Conversar consigo é conversar com Deus pois ele habita em cada um de nós.

Diariamente somos chamados a construir a nossa verdadeira igreja. Nosso filho pequeno esta cursando a Eucaristia e na nossa geladeira tem um “placar do  bom cristão” a ser preenchido. Rezar, ajudar alguém, se privar de uma gula e por aí vai são anotações que o ajudam a entender quem ele realmente é. Difícil, entretanto, tem sido apresentar o “ mundo lá fora” para ele pois muitas vezes a raiva, o ódio e a ganância atropelam suas ações e o deixam visivelmente triste.

Minha mãe sempre me disse: “o que seria do verde se todos gostassem do amarelo”, e assim levamos a vida com ele. É preciso entender que não fazemos para agradar, não fazemos para merecer aprovação e muito menos curtidas; fazemos porque é preciso ser feito e assim sendo ensinamos a ele o verdadeiro significado da compaixão.

Páscoa é renascimento e pensando bem poderia e deveria ser todo dia. Novas coisas para que apareçam na nossa vida requerem que velhas coisas sejam deixadas. Não falo aqui de excluídas, negadas e depreciadas mas sim da necessidade que temos de entender e agradecer tudo que nos trouxe até o momento e a importância de criarmos novos espaços dentro de nossa igreja espiritual.

Aproveite o dia de hoje para rezar. Perceba que sua oração pode vir disfarçada num saboroso almoço, num abraço apertado, num beijo saboroso seguido de um eu te amo. Rezar pode ser salvando vidas no seu trabalho, transportando vidas, cuidando de idosos, crianças e por aí vai. Rezar é a mais pura forma de expressar amor, primeiro para consigo e depois para o próximo. Não há como amar o próximo sem amar a si primeiro. Lembre sempre da sua família, comece por ela, pois ela é a base de tudo. Entenda que coelho não põe ovo…kkkk…mas que os de chocolate são uma delícia. Pega leve, aproveite o dia, aproveite a vida. Abençoado Páscoa!