Você sofre pelos filhos porque não pode viver por eles. Não pode doer por eles. Não pode trocar de feridas com eles. Não pode cicatrizar por eles.
Você sofre pelos filhos porque não pode viver por eles. Não pode doer por eles. Não pode trocar de feridas com eles. Não pode cicatrizar por eles.
Tem que rezar. Tem que torcer. Tem que incentivar.
Amor é estar por perto sem ferir com a superproteção.
Não vejo nenhum caminho tranquilo na paternidade e na maternidade. Você perderá os cabelos de preocupação ou eles ficarão grisalhos.
Você não relaxa. Sofre se o filho não sai de casa, não inventa programas de noite, não namora, não apresenta nenhum grande afeto para enfrentar o mundo, assim como você sofre se ele não para em casa, sai toda noite, volta de madrugada com o sol raiando, namora uma pessoa diferente a cada mês.
A solidão ou o excesso boêmio vão aterrorizar de igual maneira. Não quer que ele fique trancado no quarto em tempo integral, tampouco quer que ele não esteja disponível para o lazer ao seu lado.
Você reclama se ele não estuda, e também reclama se ele estuda demais e não se diverte nunca.
Você reclama se ele não tem amigos, e também reclama se anda com más companhias.
Você reclama se ele é um bicho do mato, e também reclama se ele é sociável em excesso.
Você reclama se ele não trabalha, não mostra iniciativa para se sustentar, e também reclama se ele é explorado, sem tempo livre.
Terá sempre medo por um lado ou pelo outro. Talvez porque projete nele as suas dificuldades de adaptação ou seus desenganos. Não deseja que ele passe as mesmas adversidades e privações que você.
A grande verdade que ninguém fala é que não pretende que o filho seja parecido com você, como os manuais da criação pregam, mas que seja diferente das suas dores.
Você educa o filho para que ele não repita os seus erros, para que não atravesse os seus traumas. É como se tentássemos avisar a cada encruzilhada de nosso rebento: “não vá por aí, eu já tomei tal caminho e não foi bom”. A nossa própria experiência nos assusta.
Se peno pela saúde e felicidade dos meus filhos, não chego aos pés dos pais dos motociclistas, dos motoboys. Tenho calafrios só de imaginar tal existência regada de apreensão e ansiedade.
Os entregadores de delivery formam a categoria mais ameaçada, porque precisam de rapidez para não gerar insatisfação tanto aos donos dos restaurantes quanto aos clientes. São obrigados, pela natureza de seu dever, a ziguezaguear no trânsito, localizar frestas impossíveis para a ultrapassagem, correr riscos em uma direção nada defensiva para reduzir minutos no engarrafamento.
Agora, quando peço comida, eu dou gorjeta para o serviço feito pelo jovem que aparece com capacete na mão, vestindo a roupa preta de chuva e abrindo a sacola térmica vermelha. Em nome de seus pais. Pensando nos seus pais. Minha vontade é abraçá-lo. Que ele volte seguro para a sua família.
Fabrício Carpinejar