Polícia e Região

Duas famílias são resgatadas de condições análogas ao trabalho escravo no interior de Venâncio Aires

Publicado em: 25 de fevereiro de 2021 às 16:15 Atualizado em: 01 de março de 2024 às 12:47
  • Por
    Guilherme da Silveira Bica
  • Fonte
    MPT
  • Foto: Divulgação
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    Operação conjunta da inspeção do trabalho encontrou trabalhadores vivendo em situação degradante, incluindo crianças entre 9 e 17 anos

    Duas famílias foram resgatadas de uma situação análoga à escravidão em uma plantação de fumo na zona rural do município de Venâncio Aires, em uma operação realizada esta semana pela Superintendência Regional do Trabalho em parceria com o Ministério Público do Trabalho do Rio Grande do Sul (MPT-RS) e a Polícia Federal (PF). Auditores-fiscais do Trabalho, agentes da PF e um procurador do MPT-RS estiveram na propriedade rural e encontraram indivíduos em situação laboral irregular, incluindo cinco crianças ou adolescentes.

    De acordo com informações do Ministério Público do Trabalho, no local, em uma área de aproximadamente 20 hectares, foram encontrados dois casais, um deles com quatro filhos e outro com três, em moradias sem condições sanitárias. A propriedade pertence a um terceiro casal, o único a ter a documentação em dia, incluindo talão de produtor rural. Os demais trabalhavam na propriedade e eram parte do sistema de integração do fumo, submetidos a condições degradantes de trabalho em razão da ausência de renda mínima para a subsistência, da precariedade das moradias e das condições do meio ambiente laboral

    Dos resgatados, cinco eram menores de 18 anos, com idades de 9, 10, 12, 15 e 16 anos. Outros dois adolescentes, de 14 e 17 anos, que também trabalhavam na moradia do produtor rural, na classificação e na amarração das folhas de fumo, foram afastados do trabalho. O trabalho no processo produtivo do fumo é vedado por lei para menores de 18 anos, e caracteriza-se como uma das piores formas de trabalho infantil. Em razão da ausência de equipamentos de proteção individual para controle do risco oferecido por agrotóxicos, e mesmo pelo contato com a folha verde do fumo durante a colheita, as crianças e adolescentes apresentavam queixas compatíveis com intoxicação aguda, como náuseas e vômitos.

    As duas famílias estavam morando junto aos locais de armazenamento de fumo, em instalações precárias e com péssimas condições sanitárias e de conservação. A água era proveniente de poços insuficientemente protegidos, sendo manifestamente imprópria para consumo humano. Ambas foram imediatamente retiradas da propriedade e encaminhadas à Assistência Social do município de Venâncio Aires. Foram emitidas guias de seguro-desemprego para cada trabalhador resgatado, inclusive para os menores de 18 anos, garantindo o recebimento de três parcelas de um salário mínimo (R$ 1.100).

    AUDIÊNCIA

    De acordo com o MPT, a área era usada para a produção de fumo vendido com exclusividade à empresa multinacional processadora Continental Tobaccos Alliance (CTA). A companhia tem um Termo de Ajuste de Conduta assinado com o MPT-RS, pelo qual se compromete a informar a existência de trabalhadores irregulares ou de crianças na atividade produtiva. Na ação fiscal, verificou-se que a empresa tinha ciência da presença das crianças e adolescentes trabalhando na plantação e não comunicou o fato ao MPT.

    Os Auditores-Fiscais do Trabalho calcularam as verbas rescisórias dos resgatados em R$ 82.432,86. A CTA foi notificada em audiência realizada na manhã desta quinta-feira, dia 25/02, a efetuar o pagamento, em razão de graves violações aos direitos humanos da  força de trabalho: notadamente o trabalho infantil e o trabalho degradante. A CTA apresentou defesa, entregou documentos e não se prontificou a pagar o montante.

    MANIFESTAÇÃO

    Procurada pelo Grupo Arauto, a CTA destacou que segue todas as leis e os acordo firmados com o MPT. "A CTA Continental Tobaccos Alliance S/A. reitera que realiza todas as suas operações em conformidade com a legislação que as regulamenta, bem como atende todas as condições de Acordos firmados com o Ministério Público do Trabalho. As relações entre empresa e produtores de tabaco igualmente são regidas pela lei e tratam-se de relações exclusivamente comerciais. A empresa repudia práticas de trabalho escravo e/ou infantil, neste sentido atua com programas voltados à erradicação do trabalho infantil e em cumprimento às leis trabalhistas, bem como em cooperação com órgãos governamentais", disse em nota.