Projeto da escritora Marli Silveira conta com parceria de Vanise Garlet em oficina de pintura e Sandro Figueiredo na música para as detentas
A compreensão humana sempre desafiou a escritora, professora, poeta e filósofa vera-cruzense Marli Silveira, que desde 2012 começou a desenvolver o projeto À flor da pele, realizado no presídio de Santa Cruz do Sul até 2016, com as mulheres ali reclusas. Ano passado ela retomou o trabalho, a tentativa de compreender a condição humana de quem está no presídio, então lançou o livro Cartas de liberdades, e esse ano retomou o mote ao se aproximar da reclusão, voltando a fazer atividades com as mulheres detentas, só que agora no Presídio Feminino de Rio Pardo.
Marli explica que sempre se manteve vinculada, a partir de um viés teórico, da compreensão humana. Tem escrito e lido sobre isso, no campo da filosofia, para minimamente compreender a condição humana. E o fenômeno da detenção tem lhe ocupado desde 2012. De um lado, a tentativa de compreender a finitude própria do fenômeno do encarceramento, se ele pode ser encarado como uma experiência de finitude, o que ela chama de psicagogia a partir dessa experiência da reclusão.
E outro fundamento dessa reaproximação, que vai além da pesquisa, é o sentido de compreender que o ambiente carcerário também precisa do apoio, do envolvimento cultural, artístico e literário, que é da sua alçada, e por isso resolveu promover espécie de sarau poético na instituição. “Já entregamos cadernos para elas exercitarem a escrita, porque escrever pode ser um exercício de humanidade, de compreensão, de demora sobre si mesmo”, resume Marli.
Outras oficinas também têm sido desenvolvidas nesses encontros que levam arte para as detentas, como a pintura, com a Vanise Garlet, e música, com o Sandro Figueiredo. Mas o foco de Marli, enquanto escritora, é pensar a escrita como exercício de si, delas manifestarem sua própria condição, aproximá-las da sociedade. “Tem o caráter de pensar a literatura como experiência de finitude importante para a mulher reclusa. Todas as vezes que estou com elas, elas leem quando assim desejam, compartilham suas escritas, eu também leio com elas, uma espécie de terapia poética. Esses textos depois serão reunidos em um livro, a partir de análise prévia. São textos carregados de sentimento, do que ocorre na ambiência afetiva, emocional, cultural, psicológica daquele momento que a mulher resolve se expor, se escrever. É um momento muito significativo para ela. O quanto escrever promove essa demora sobre si, e num ambiente de cerceamento de liberdade, traz uma escrita com carga de finitude própria desse ambiente, de alguém que vive essa condição. E elas apontam o quanto esse exercício tem sido um gesto significativo na vida delas”, reflete a escritora.
Do ponto de vista humano, afetivo, considera Marli Silveira, também contribui ao remeter às detentas uma sensação de sentir-se minimamente livre, através das palavras, ainda que estejam dentro do presídio. Esses encontros recheados de arte, literatura, escrita produzem um sentido para todos os lados, completa a vera-cruzense, pode ser momentâneo ou perdurar, mas é um cultivo que vai fazendo significado para todas.
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