Da simplicidade da sua infância, a santa-cruzense carrega a lembrança mais saudosa da reunião familiar. Hoje, se mantém participativa ao desfilar na Christkindfest
Quem vê ela sobre o carro alegórico da Christkindfest que deseja Feliz Natal em diversos idiomas, esbanjando vitalidade como Mamãe, ou melhor, Vovó Noela, talvez nem imagine o tanto de história que dona Brunilda Rech guarda na sua memória e no seu coração. São 97 Natais para recordar. Os da infância, ainda que distantes, parecem ainda mais vívidos nas lembranças, afinal, é quando criança que a magia acontece. E se hoje Brunilda, Bruni ou simplesmente o “pacotinho” do filho André é presença confirmada no desfile de Natal de Santa Cruz do Sul e em tantas outras programações da cidade – como a Oktoberfest, Procissão das Criaturas e Bailinho da Borges – é porque ela sempre esteve à frente do seu tempo. E mantém a jovialidade no pensamento, mesclada com a maturidade que a acompanha pelo tempo.
Brunilda Rech nasceu em Santa Cruz do Sul em 6 de maio de 1927. Numa Santa Cruz, obviamente, muito diferente do que é hoje. Assim como o papel da mulher era muito diferente das conquistas celebradas hoje. Em sua juventude, elas casavam cedo, com 18, 19 anos, e logo tinham filhos. Dançar num baile? Só com um rapaz. Quem tivesse maior “ousadia” receberia rótulo de assanhada, para não dizer coisa pior. Pois Brunilda driblou todas as regras e os preconceitos. Sempre amou dançar, por que iria se contentar com um único par a noite toda? Quem achava que era encalhada, mordeu a língua: Bruni casou somente aos 31 anos. E depois de ter dificuldade em engravidar, deu à luz a André com 38. Mas o que isso tem a ver com o Natal?
O pensamento libertador de Brunilda sempre esteve com ela, em todas as fases de sua vida. E a conduziu a subir em um carro alegórico aos 97 anos e, antes disso, para se vestir de personagens e viver de novo aqueles Natais de sua infância. Ao ser questionada sobre a lembrança mais doce que possui da festividade cristã, antigamente, ela recorda da montagem do pinheiro natural, do aroma da bolacha sendo produzida em família e, como toda criança, lembra do presente. Não, não era uma boneca, um brinquedo “da moda”. O comum naquela época era o pedaço de pano para ser costurada a roupa nova, e o sapatinho. “Por que não sou pequena de novo?”, questiona o pacotinho.
A religiosidade também é uma marca da festa cristã na vida de Brunilda. Antes de sentarem à mesa, os pais, Antônio e Maria Carolina, e seus seis filhos não abriam mão de fazer uma oração, afinal, é tempo de agradecer pela mesa farta, pelo ano que se passou, e também de cantar o tradicional “Noite Feliz”. Convidada a comparar com os dias atuais e dar um pulo no tempo, Brunilda dispara: “hoje é tudo comercial, se não tem dinheiro, não tem Natal”. A verdade das palavras contrasta com a simplicidade de tudo o que viveu em outra época.
Afinal, não se tinha a fartura de hoje, a ceia era diferente sim, mas mais simples, como todos os rituais. O que mais sente saudade? A reunião familiar, revela ela. Porque naturalmente, aos 97 anos, já não são tantos familiares que convivem de perto e amigos já partiram. Na companhia do filho, André, seu presente, ela faz questão de ter comida boa na mesa, ir na missa em algum momento próximo do Natal para manter acesa a fé cristã herdada de seus antepassados e manter a cabeça ativa vivendo a festa dos dias atuais, em plena Christkindfest, sendo feliz em cima de um carro alegórico. A vida experimentada na plenitude, em convivência com a comunidade que sempre a abraça e acolhe. “Natal é amizade”, conceitua ela, “é cuidar”, acrescenta. E com esses valores, dona Brunilda mostra que além de comemorar o aniversário do menino Jesus, faz nascer o Natal em sua vida, ano a ano, há 97 anos.
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