Mensagem do dia

Cultive a leveza

Publicado em: 23 de setembro de 2022 às 08:52 Atualizado em: 06 de março de 2024 às 12:18
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Era uma quarta-feira à noite. Eu estava aguardando um táxi para me levar ao encontro de uma amiga. Nessa espera, uma chuva de verão, dessas que caem de forma intensa, resolveu me fazer companhia. Em poucos segundos, tudo começou a me irritar: a forma da chuva cair na diagonal molhando minha roupa e meus sapatos, as pessoas que se espremiam para também se proteger dos pingos e dos raios, a demora do motorista que precisou tomar um caminho mais longo por causa do congestionamento. O que seria uma espera pequena se tornou um tormento, ao menos ali, dentro da minha cabeça.

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Era uma quarta-feira à noite. Eu estava aguardando um táxi para me levar ao encontro de uma amiga. Nessa espera, uma chuva de verão, dessas que caem de forma intensa, resolveu me fazer companhia. Em poucos segundos, tudo começou a me irritar: a forma da chuva cair na diagonal molhando minha roupa e meus sapatos, as pessoas que se espremiam para também se proteger dos pingos e dos raios, a demora do motorista que precisou tomar um caminho mais longo por causa do congestionamento. O que seria uma espera pequena se tornou um tormento, ao menos ali, dentro da minha cabeça.

Entre o meu emaranhado de reclamações mentais, uma senhora de uns 70 anos parou ao meu lado e pediu ajuda para se abrigar. “Eu sou muito mais jovem que minhas netas. Ah lá: só sabe reclamar ao invés de agradecer”, disse sorrindo ao apontar uma moça que seguia caminhando pela calçada à nossa frente. Naquele momento, senti meu rosto corar e os músculos do meu corpo relaxaram. E eu só conseguia pensar que, certamente, aquela senhora era também mais jovem que eu.

Às vezes, colocamos tanto peso nas coisas corriqueiras que, sem perceber, vamos nos tornando pessoas rabugentas, que já parecem ter vivido uma existência inteira entre lamúrias e dias de tempestade. Maldizemos o sol, a chuva, as estações do ano, as palavras ditas na voz do outro, e criamos uma sucessão de inimigos imaginários, que rapidamente levam embora a nossa paz e principalmente a nossa leveza.

Vida com leveza depende de nós. Nesse caso, ter uma vida mais leve ou mais pesada nem tem realmente a ver com a idade ou com os quilos do nosso corpo na balança, mas com a forma com que escolhemos ver e encarar os acontecimentos em nosso dia a dia. A leveza com que as pessoas se preocupam hoje é a do corpo, estamos vivendo uma obsessão pela magreza. A gente não pode prestar atenção só nesse peso porque, enquanto isso, a alma engorda assustadoramente. Você vê pessoas com corpos esbeltos, malhados, e com almas pesando 150 quilos. Eu brinco que o grande risco que a gente vive hoje é de ver uma população com obesidade mórbida de espírito.

No trabalho, no mercado, dentro do ônibus e até na própria casa: basta olhar com um pouco mais de atenção para identificarmos como andamos meio pesados e pouco gentis, cada vez mais estressados, intolerantes, raivosos e indelicados, presos em nossas buscas externas, nos esquecendo daquilo que trazemos por dentro.

Nós não paramos mais. Estamos eliminando as pausas da nossa vida. O parar para pensar não existe mais. E, se não fazemos isso, se não paramos para desacelerar um pouco, continuando pelo caminho com cargas excessivas de preocupações, dificilmente encontraremos uma forma de sermos mais leves. 

E não precisamos parar por um tempo tão longo. Muitas vezes, alguns minutos com os pensamentos soltos, sem preocupações ou censuras, já são suficientes para iniciarmos o processo de “emagrecimento da alma”.

Débora gomes