Mensagem do dia

Que saudade da vida simples!

Publicado em: 09 de dezembro de 2022 às 09:37 Atualizado em: 06 de março de 2024 às 12:12
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Sou do tempo em que ainda se faziam visitas. Lembro-me de minha mãe mandando a gente caprichar no banho porque a família toda iria visitar algum conhecido. Íamos todos juntos, família grande, todo mundo a pé. Geralmente, à noite.

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Sou do tempo em que ainda se faziam visitas. Lembro-me de minha mãe mandando a gente caprichar no banho porque a família toda iria visitar algum conhecido. Íamos todos juntos, família grande, todo mundo a pé. Geralmente, à noite.

Ninguém avisava nada, o costume era chegar de pára-quedas mesmo. E os donos da casa recebiam alegres a visita. Aos poucos, os moradores iam se apresentando, um por um.

– Olha o compadre aqui, garoto! Cumprimenta a comadre.

E o garoto apertava a mão do meu pai, da minha mãe, a minha mão e a mão dos meus irmãos. Aí chegava outro menino. Repetia-se toda a diplomacia.

– Mas vamos nos assentar, gente. Que surpresa agradável!"

A conversa rolava solta na sala. Meu pai conversando com o compadre e minha mãe de papo com a comadre. Eu e meus irmãos ficávamos assentados todos num mesmo sofá, entreolhando-nos e olhando a casa do tal compadre. Retratos na parede, duas imagens de santos numa cantoneira, flores na mesinha de centro… Casa singela e acolhedora. A nossa também era assim.

Também eram assim as visitas, singelas e acolhedoras. Tão acolhedoras que era também costume servir um bom café aos visitantes. Como um anjo benfazejo, surgia alguém lá da cozinha, geralmente uma das filhas e dizia:

– Gente, vem aqui pra dentro que o café está na mesa.

O café era apenas uma parte: tinha pães, bolo, broas, queijo fresco, manteiga, biscoitos, cucas, leite… Tudo sobre a mesa. Juntava todo mundo e as piadas pipocavam. As gargalhadas também.

Pra quê televisão? Pra quê celular, internet? Pra quê rua? Pra quê droga? A vida estava ali, no riso, no café, na conversa, no abraço, na esperança…. Era a vida respingando eternidade nos momentos que acabam…. Era a vida transbordando simplicidade, alegria e amizade…

Quando saíamos, os donos da casa ficavam à porta até que sumíamos na estrada… Ainda nos acenávamos. E voltávamos para casa, caminhada muitas vezes longa, sem carro, mas com o coração aquecido pela ternura e pela acolhida. Era assim também lá em casa… 

Recebíamos as visitas com o coração em festa… A mesma alegria se repetia. Quando iam embora, também ficávamos, a família toda, à porta. Olhávamos, olhávamos… Até que sumissem no horizonte da noite.

O tempo passou e me formei em solidão. Tive bons professores: televisão, vídeo-cassete, DVD, e-mail, smartphone, 4g, wi-fi… 

Cada um na sua e ninguém na de ninguém. Não se recebe mais em casa. 

Agora, quando a gente até quer ver alguém faz encontros fora de casa:

– Vamos marcar uma saída?

Ninguém quer entrar mais.

Assim, as casas vão se transformando num vazio.

Casas trancadas… Mas pra quê abrir? 

O ladrão pode entrar e roubar a lembrança do café, dos pães, do bolo, das broas, do queijo fresco, da manteiga, dos biscoitos, das cucas, do leite…

Que saudade do compadre e da comadre!