Colunista

Eduardo Wachholtz

Dízimo para concessionária: novo pedágio na região gera debate

Publicado em: 04 de março de 2025 às 07:01
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Imagine que, da noite para o dia, 10% do valor que um trabalhador dispõe para passar o mês seja cortado. Esse é o impacto que pode ocorrer caso a instalação de um pedágio com o sistema free flow em Venâncio Aires seja concretizada. A previsão da nova cobrança faz parte do projeto de concessão da RSC-453 para a iniciativa privada, que, além da cobrança, prevê a duplicação da rodovia e outras melhorias. Antes de transferir a responsabilidade pela gestão para a iniciativa privada, o governo do Estado diz estar ouvindo as comunidades, por meio de uma consulta pública, com o objetivo de entender as demandas locais.

De acordo com o plano atual, a estrutura do pedágio deve ser instalada no quilômetro 10 da RSC-453. Nesse ponto, os moradores de Vila Palanque, Linha Travessa e outras localidades vizinhas, assim como os de Mato Leitão, seriam diretamente impactados. Muitos desses residentes se deslocam diariamente para a região central de Venâncio Aires, onde atuam profissionalmente e, eventualmente, buscam atendimentos de saúde, como no Hospital São Sebastião Mártir, e outros serviços essenciais que só são encontrados no segundo município mais populoso do Vale do Rio Pardo.

A tarifa projetada é de R$ 3,77 e, considerando 20 dias úteis com ida e volta, em um mês, seriam necessários R$ 150,80 para o trabalhador. Embora esse valor possa não parecer significativo, é importante considerar que o novo salário mínimo, depositado pela primeira vez em fevereiro, é de R$ 1.518,00. Dessa forma, além dos custos com manutenção e combustível, um trabalhador que recebe esse valor desembolsaria 10% do seu rendimento apenas com o pedágio. Em um orçamento familiar apertado, como é o caso de grande parte das famílias brasileiras, esse impacto seria considerável.

A concessão e a criação de novos pontos de cobrança têm sido justificadas pelos custos da duplicação e de outras obras na RSC-453. A importância das melhorias na rodovia é inegável, já que ela conecta Santa Cruz, Vera Cruz, Rio Pardo e outros municípios da região com o Vale do Taquari e também serve como caminho para a Serra Gaúcha. Contudo, é preciso considerar o cidadão que já enfrenta uma das maiores cargas tributárias do país. A corda parece, mais uma vez, estar prestes a arrebentar no lado mais fraco. Não existe almoço grátis, mas é necessário buscar alternativas.

Caso a cobrança seja efetivada em um futuro próximo, é preciso que sejam tomadas medidas para minimizar o impacto sobre os moradores da região. Uma das propostas que surgiu, apresentada pelo vereador Jeferson Schwingel, de Venâncio Aires, filiado ao Progressistas, é a isenção para os veículos emplacados em Venâncio Aires e Mato Leitão. Ele esteve presente no protesto realizado no final de semana, às margens da rodovia, e defende que essa e outras alternativas sejam levadas para as lideranças estaduais nas próximas semanas, com o apoio de um movimento que vem ganhando força na região.

Outra preocupação é com o sistema de cobrança previsto. O free flow funciona por meio de um pórtico instalado na pista, no qual câmeras captam a placa e identificam o tipo de veículo ao passar pelo ponto de cobrança. Os motoristas que possuem um tag de pedágio no para-brisa pagam imediatamente o valor. Já os motoristas sem o dispositivo podem efetuar o pagamento da tarifa em até 30 dias. Caso não realizem dentro do prazo, a infração de trânsito aplicada será de R$ 195,23, além da adição de cinco pontos na carteira de motorista. E esse tipo de infração tem ocorrido com frequência.

No Rio Grande do Sul, o Departamento Autônomo de Estradas de Rodagem (Daer) informa que, entre janeiro e setembro de 2024, foram aplicadas 254 mil multas devido à inadimplência no pagamento das tarifas nos pórticos de free flow. Esse dado levanta ao menos duas reflexões. Seria a inadimplência um reflexo da falta de vontade ou do desconhecimento dos motoristas sobre o sistema? Os moradores do Vale do Rio Pardo estão preparados para essa nova tecnologia?

Para quem sai de Santa Cruz do Sul e deseja seguir até Lajeado, o maior município do Vale do Taquari, referência em alguns serviços, caso seja confirmada a cobrança em Venâncio Aires e seja mantida a estrutura existente em Cruzeiro do Sul, como inicialmente proposto, serão três cobranças ao longo do trajeto. Além das duas estruturas na RSC-453, há também a praça de pedágio da RSC-287, em Vila Arlindo, na Capital do Chimarrão. Isso representaria um pedágio a cada 20 quilômetros. Qual seria o limite para a criação de novas estruturas? A comunidade será ouvida antes de qualquer decisão final?