Após alguma tempo veio um ciclista, pelo acostamento, da direção de Lajeado a Arroio do Meio, e apanhou o pacote
A cidade de Arroio do Meio era tranquila, ocorriam poucos crimes e raros conflitos entre as pessoas. Em Nova Bréscia, o que mais agitava era o Festival da Mentira. O que me dava mais trabalho eram os acidentes nos oito quilômetros da descida da serra, em Pouso Novo, que integravam minha jurisdição.
Estava participando de um jogo de futebol de salão, noturno, no ginásio central da cidade, quando chegou um colega com uma notícia bombástica:
– Havia sido preso em flagrante um homem pela pratica do crime de extorsão.
Explicou que um conhecido empresário da cidade havia recebido cartas, com graves ameaças, exigindo certa quantia em dinheiro. Para não concretizá-las, orientou a vítima a colocar o dinheiro em um pacote, deixando em lugar determinado, à margem da rodovia, entre Arroio do Meio e Lajeado.
Sob a orientação da polícia, que foi logo procurada, na hora marcada a vítima deslocou-se para Lajeado e largou, no acostamento, o pacote que supostamente conteria o dinheiro exigido.
Narrou meu interlocutor que a polícia cercara o local, permanecendo escondida na densa vegetação.
Após alguma tempo veio um ciclista, pelo acostamento, da direção de Lajeado a Arroio do Meio, e apanhou o pacote, momento em que foi cercado pela polícia e preso em flagrante.
Como o crime teria ocorrido em minha jurisdição, tão logo cheguei em casa liguei para a Delegacia de Polícia informando que permaneceria acordado, aguardando o Auto de Prisão em Flagrante, que seria o normal em um caso assim, para sacramentar a prisão.
O auto não veio e só posteriormente chegou um pedido de prisão preventiva do acusado, que foi decretada, com as informações existentes sobre a autoria e a materialidade do crime de extorsão, previsto no art. 158, do Código Penal.
Dias depois encontrei o Delegado de Polícia na rua e ele comentou que continuavam chegando cartas. Como assim? Questionei-o. Se o acusado está preso?
Também fiquei sabendo que, tanto a polícia como familiares, faziam sigilosamente vigília da casa da vítima e quase ocorrera uma tragédia, quando se defrontaram, achando que o outro era o malfeitor.
Imediatamente ordenei a soltura do acusado e, posteriormente, como continuaram as cartas, algumas colocadas em outros locais, acabou sendo preso, outra pessoa, na cidade de Lajeado. Provas circunstanciais e materiais, como a perícia da letra, confirmaram ser este o verdadeiro autor da extorsão.
No curso do processo foi ouvido, agora como testemunha, o rapaz que havia sido preso na rodovia com sua bicicleta. Relatou que voltava do trabalho, pelo acostamento, quando viu o pacote e o recolheu, momento em que foi preso pela polícia.
Relatou que foi algemado e levado para a Delegacia e, posteriormente, durante a noite, removido para a Delegacia de outra cidade. Logo associei ao meu telefonema, de que aguardaria acordado o auto de prisão em flagrante. Queixava-se de ter sido torturado, razão de eu ter ordenado a extração de cópias do processo e remetido aos órgãos competentes para investigação e punição, se fosse o caso.
Tendo sido promovido para outra Comarca, acabei não acompanhando os fatos posteriores e julgamento do réu.
O fato traz muitas lições sobre julgamento precipitado e, se verdadeiras as narrativas, a falta de profissionalismo e equívocos da época, entrando para a história forense da tranquila comarca.
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