Luciana Jost esteve perto da morte, mas mais próxima ainda estava de Deus, que lhe deu a segunda chance para ser uma nova pessoa. Nesta Páscoa, conheça o renascimento Luciana
Dia 22 de dezembro de 2023. Luciana Jost se deslocava de Linha Fundinho, local onde mora, até a lavoura de soja do marido, Rafael, do outro lado do município. Ao passar pelo trevo de Linha Capão, famoso pela má reputação em acidentes, a agricultora de 48 anos colidiu com um veículo, fato que mudaria sua vida para sempre. Próximo ao Natal, os ferimentos em razão do impacto levaram Luciana a perder a perna esquerda.
Agora, próximo da Páscoa, ela vive uma realidade diferente e, reconhece, renasceu como uma nova pessoa.
O impacto
“Eu estava com pressa, como sempre”, desta forma, Luciana Jost começa a narrar o dia em que sua vida mudara para sempre. “Meu marido estava plantando soja na lavoura e eu estava indo de moto ajudá-lo. No trevo vi de longe dois carros parados. Diminuí porque ali é um lugar perigoso. Quando faltavam alguns metros, o carro da frente avançou. Não havia mais tempo. Apenas fechei os olhos e pedi para que Deus me guardasse”, relembra.
De olhos fechados, Luciana apenas ouviu o impacto. De início, o barulho não parecia ser nada além de danos à moto. “Eu não estava sentindo nada.” A revelação veio logo após abrir as pálpebras, retirar o capacete e acordar num dos canteiros do trevo. “Puxei minha perna para um lado e vi que ela estava grudadinha só por um cantinho. O pé também estava assim. Mas não sentia dor, apenas uma pressão que parecia puxar a perna esquerda para o chão. A direita eu sentia uma queimação.”
Resgate
Sozinha, após a fuga do motorista do outro veículo envolvido no acidente, a agricultora começou a gritar por socorro. A ajuda não demorou. Um caminhoneiro, que vinha logo atrás dela, prestou auxílio com um torniquete com as cintas. Outras pessoas logo vieram e fizeram, juntas, uma roda de ajuda. Uma mulher, desconhecida, a acalmava enquanto um amigo da família ligava para o marido Rafael. Um travesseiro para apoio da cabeça e até mesmo um guarda-chuva para aliviar o sol. Logo chegaram também a Brigada Militar e o Corpo de Bombeiros Militar. “Eu via estas pessoas como anjos. Eu digo hoje que Deus existe e que anjos existem. São pessoas que Ele coloca no nosso caminho.”
Os Bombeiros logo a levaram para o Hospital Santa Cruz pois, devido ao sangramento, não haveria tempo de encaminhar a outra casa de saúde. No HSC, no momento da chegada, não havia um médico ou ortopedista disponível, nem mesmo os recomendados pela agricultora. Entretanto, em meio à confusão e à incerteza, Marcelo Agra, cirurgião vascular, apareceu para verificar se alguém precisava de ajuda. Havia, no entanto, a necessidade de outro especialista. “Foi quando Deus colocou no meu caminho Guilherme Pauli.” Bem como o colega, ele ofereceu auxílio e, rapidamente, direcionaram-se à cirurgia.
Luciana ficou internada três dias após o procedimento, na unidade de terapia intensiva (UTI). Após, foi para um quarto geral, com mais pacientes. A quebra da solidão lhe deu sorrisos e, conforme relata, foi um tempo de muito divertimento. “Eles não entendiam porque eu sorria. Mas eu estava viva, Deus tinha me deixado chegar até ali e eu tinha que fazer daquele limão uma limonada.”
Após algum tempo, Luciana saiu do quarto de andador. Foi quando descobriu a existência de um vídeo do acidente, que já circulava nas redes sociais. A gravação não a impactou negativamente. “Uma enfermeira perguntou: é seu aquele vídeo? Eu respondi: É sim, lá eu tava mal, mas olha como hoje eu estou bem. Tô feliz.”
Uma nova Luciana renasce
Evidentemente, perder a perna foi uma situação delicada para Luciana. A noção que o membro poderia ser amputado veio logo quando notou a situação após o acidente. Ao chegar no HSC, a ordem foi clara: “se tiver que amputar, tá tudo bem.”, salientou Luciana.
A decisão não foi por acaso. “Viemos para cá com um caminho em linha reta. Há momentos que vamos descer, outros que vamos subir. Mas sempre Deus vai estar conosco”, pontuou. “E eu precisava disso para continuar vivendo.”
Apesar dos sorrisos fáceis e da alegria contagiante, Luciana não esconde os momentos de vulnerabilidade e melancolia em relação ao luto pela perda do membro. “Eu sei que nunca mais vou fazer o que eu fazia. Não vou mais correr como corria, andar nos tratores, subir no caminhão”, confessa. Com a voz embargada e lágrimas correndo pelas bochechas, como a agricultora que é, Luciana não pensa em desistir. “Eu vou continuar. Do meu jeito, da minha forma, com todas as limitações, eu quero vencer. Eu vou continuar”, frisou. “Estampar um sorriso no rosto não significa que todos os dias eu estou forte. Haverá aqueles dias que vou chorar, vai dar uma música que vai me lembrar que não vou fazer mais as coisas da forma que eu fazia.”
A saudade do passado, conforme explica, é um sentimento que constantemente aparece no coração de Luciana. “Eu sinto falta do resto, da perna, do joelho. Eles fizeram parte da minha vida, vivi 47 anos com ela. Mas hoje tenho um ritual. Lembro deles com carinho, abraço eles. Eles fizeram parte de mim, mas os deixo ir. Para que eu possa seguir minha vida. E seguir da forma que eu estou. Amava meu corpo como era antes, mas amo meu corpo como ele é hoje. É isso que me ajuda a seguir em frente.”
Hoje, o dia a dia de Luciana ainda é limitado. Fisioterapia constante acompanha a televisão e uma série de cursos on-line. Outros momentos, o chimarrão com a visita quebra a rotina repetitiva.
Isso, no entanto, deve mudar em breve. Luciana irá receber uma prótese para substituir a perna perdida até junho. Conforme ela relata ter ouvido dos médicos, o equipamento vai permitir a realização das atividades que ela costumava fazer. “Eles dizem que, se eu tiver vontade, vou poder voltar a fazer minhas coisas novamente. Ir na lavoura, andar de trator, aproveitar como eu costumava aproveitar”, projetou, feliz, Luciana. A agricultora, inclusive, recusou uma prótese mais tecnológica, eletrônica, em detrimento de fazer o que gosta. “Essa não pode pegar água e nem poeira! Como não vai pegar poeira no campo? Não me serve”, brincou.
Uma nova pessoa
O caso trouxe a ela lições que seguirão até o fim dos seus dias. “Eu tenho aquele acidente como um recomeço de vida. Sempre buscava fazer tudo certo para que não me dissessem que eu fiz algo de errado. Mas perfeição não existe. Temos que aproveitar o tempo com as pessoas porque ele passa rapidinho”, projeta Luciana.
A rotina acelerada, inclusive, sempre foi parte da vida dela. Filha, trabalho, saída com as amigas, dentre tantas outras questões eram tarefas e compromissos prazerosos, mas sempre feitos com pressa. “Hoje vejo que temos que fazer tudo isso, mas com calma. Um pouco de cada vez. Hoje eu vivo o hoje. Tudo no seu tempo, mas sempre com vontade de fazer melhor que ontem.”
Os aprendizados lhe trouxeram uma nova visão e uma forma diferente de abordar a vida. “Tu não vais satisfazer todo mundo. Você tem que se satisfazer. Às vezes deixamos de nos agradar para agradar os outros”, pontuou.
“Influencer” Luciana
Diariamente, Luciana é presente nas redes sociais, especialmente no Instagram (@lucianajost), onde compartilha a rotina – incluindo as sessões de fisioterapia -, os desafios e os pensamentos que a acompanham nesta nova fase, bem como muitos sorrisos. O lugar também é oportuno para dar aos amigos novidades sobre esta nova fase da vida. “Renascer é viver uma segunda chance”, escreveu ela, para o mundo ver.
Confira a reportagem em vídeo:
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