Colunista

Moacir Leopoldo Haeser

O santo monge do Botucaraí

Publicado em: 25 de fevereiro de 2025 às 08:20
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Quando era alertado do perigo, subia o morro e desaparecia. Mesmo cercado pelas tropas, que varriam o morro, não o encontravam, voltando a surgir já em Santa Maria

A Vila Germânia integrava o Município de Rio Pardo que, junto com Porto Alegre, Rio Grande e Santo Antônio da Patrulha, formavam o Estado do Rio Grande do Sul, sendo Rio Pardo a Capital.

Lá por 1845 apareceu na Vila Germânia, futuro Município de Candelária, o monge José Maria D’Agostini, refugiando-se no Cerro Botucaraí, onde logo adquiriu a fama de milagreiro, curando doentes com ervas medicinais.

Uma pesquisa sobre suas andanças são inacreditáveis. Teria andado pela Venezuela, Equador, Colômbia e Peru. Há notícias que teria andado também no Pará, no Rio de Janeiro e São Paulo. No Rio Grande do Sul há registros em Candelária e no Campestre, em Santa Maria.

Entre Candelária e Santa Maria, conseguia fugir das perseguições dos militares, pois os chefes da época não gostavam das concentrações e pregações, temendo uma revolta da população.

Por sua atuação milagrosa, teria feito brotar a “santa fonte”, ao pé do morro – onde muitas vezes saciei minha sede – atendendo as pessoas que o procuravam e fazendo suas pregações.

Quando era alertado do perigo, subia o morro e desaparecia. Mesmo cercado pelas tropas, que varriam o morro, não o encontravam, voltando a surgir já em Santa Maria.

O mistério de seu dom de simplesmente “desaparecer”, não escapou da argúcia dos quatro adolescentes, que várias vezes escalaram o morro. Meu pai havia comentado que existiria uma outra trilha para escalar o morro, pelo outro lado, e que não era muito visível.

Numa das escaladas, vasculhamos todo o topo do morro e localizamos o lugar, meio coberto pela vegetação.

Era uma antiga trilha que iniciava junto ao penhasco do lado norte. Havia um paredão de uns dez metros de altura que, após superado, daria na trilha invisível.

Meus colegas mais velhos amarraram com cordas um colega mais novo, e mais leve, e o baixaram no paredão. A queda de uma pedra sobre a cabeça, e o consequente choro e sangramento, fez com que o içassem novamente, encerrando a aventura. Um dos colegas garante que era eu, mas sinceramente não me lembro… Deve ser por causa da pedra.

Contam que o monge foi a Rio Pardo desafiar seus algozes, fazendo pregações públicas, condenando a vida devassa, a escravidão e o aprisionamento de crianças indígenas.

Expulso da Capital, saiu montado em uma mula, virado ao contrário, amaldiçoando a cidade, dizendo que essa nunca progrediria enquanto existisse ali um membro daquela família.

Após sua fuga da região, há registros de sua presença em Taió, Lajes e Ilha do Arvoredo, em Santa Catarina e Lapa, no Paraná. Há registros de suas pregações polêmicas também em São Borja e Porto Alegre.

Expulso do Brasil, reapareceu na Argentina, Paraguai, Chile, Cuba e México. Após passar em Quebec, no Canadá, e Nova York, nos Estados Unidos, acabou fixando-se em uma montanha no Novo México, onde permaneceu até 1867. Teria sido assassinado pelos índios Apaches na cidade de Mesilla, onde está sepultado.

Caso se trate da mesma pessoa, é inacreditável que esse monge italiano, magro, barbudo e maltrapilho, em tão pouco tempo, com a precariedade de estradas da época, tenha marcado sua passagem por lugares tão distantes um do outro.

Mas é como se diz milagre não se explica… se crê.

Pelo sim e pelo não, alguns anos atrás o prefeito de Rio Pardo, com a benção do Bispo, junto com um grupo de pessoas, escalaram o morro, onde fizeram orações e pediram perdão ao monge…

Parece que o perdão foi concedido, notando-se, em seguida, que a antiga Capital retomou o progresso…