Ao promover o reencontro de pais e filhos a cada resgate, Jhonatan Martins ressignificou o amor com a paternidade
Como toda criança, Luiza cresceu conhecendo os super-heróis da ficção, aqueles que protagonizam o cinema, viram brinquedos e fantasias que divertem os pequenos. Aprendeu a se identificar com a Mulher Maravilha, afinal, é uma menina. Mas foi crescendo e aos oito anos de idade, quando pedido para desenhar a visão que ela tem de super-herói, a capa imaginária ganha a inscrição CBMRS. Seu pai é bombeiro. E ao lado de Jhonatan Martins, a menina tratou de desenhar Suri, a cadela da raça pastor-alemão que pertence à família e que é treinada para atuar lado a lado do bombeiro em sua principal atividade: resgatar pessoas. E a cada resgate – dos vivos e dos corpos de quem faleceu – Jhonatan reforça a cada dia maior certeza: a paternidade ganhou um novo sentido em sua vida.
Antes de se tornar bombeiro, Jhonatan foi policial militar, a segurança pública está no seu DNA. Em 2019, escolheu seu destino e salvar vidas junto aos bombeiros se tornou sua meta. Em Porto Alegre começou a atuar e a fazer diversos cursos e qualificação, “quis ser o melhor bombeiro que pudesse ser”, resume. E para isso, teve que driblar a saudade da família deixada em Santa Cruz através de vídeo-chamadas. Mas ao retornar, o bombeiro, que é natural de Rio Pardo e acabou adotando a Terra da Oktoberfest como lar, acabou se integrando ao grupo que se especializou em resgates, trabalho que nunca fora tão intenso desde setembro do ano passado.
De lá para cá, a dedicação tem sido quase exclusiva a esse trabalho, com pequenos intervalos na atuação do bombeiro. Enquanto a água estava alta, junto dos companheiros se dedicou a resgatar as pessoas em suas casas. E ainda hoje, no Vale do Taquari, inclusive neste Dia dos Pais, se dedica à procura dos desaparecidos, para tentar levar o conforto às famílias que esperam poder enterrar seus parentes que se foram. E tudo isso, Luiza, sua filha, acompanha, entende, conhece. E aprendeu a admirar no pai a figura de um herói. Aquele clichê do herói sem capa que se dá aos bombeiros, a menina sabe bem o que é isso.
Herói sem capa, mas com farda
“Sempre falei a ela que muitas famílias precisam de ajuda, e assim tentei justificar minha ausência”, explicou o pai. E essa ajuda não é apenas nessas situações de enchente, extremas, como as vividas em todo Rio Grande do Sul. Porque o bombeiro busca salvar o tempo todo, em diferentes formas. Na água, no fogo, na altura, no acidente. E a menina, atenta, reconhece.
Mas em setembro, a equipe de resgate que Jhonatan integra salvou pelo menos 150 pessoas no Vale do Taquari, calcula. Esse ano, o número foi muito maior, porque a enchente assumiu maiores proporções e ainda mais lugares. Em Vera Cruz, na Linha Borges de Medeiros, aconteceu um desses difíceis resgates de maio. A área, relembra ele, era muito próxima ao rio, a correnteza era forte e já estava de madrugada. Quebrou a hélice do barco numa cerca de madeira, impossível de ver naquela hora. Mas ele não desistiu até tirar de casa o pai, a mãe e o filho cadeirante.
Nessas horas, como pai, ele enxerga o olhar do outro, desesperado, e só pensa em manter a família unida. “A gente deixa a emoção de lado e foca na razão, com segurança, e só depois de tudo que para e analisa cada situação. O pai sempre tenta fazer com que o filho seja socorrido em primeiro lugar, mesmo que tenha que esperar, ficar para o segundo momento”, argumenta.
Emoção em salvar famílias
Outro episódio inesquecível para Jhonatan foi quando colocou uma criança pequena na embarcação, uma menina, impossível não lembrar da própria filha naquele instante. E a mãe da garotinha lhe segurou no braço e clamou: “salva meu bem mais precioso”. O resto a água já havia levado. Mas mãe e filha permaneceram juntas. Essa é a maior recompensa, frisa ele, quando a equipe de resgate consegue promover os reencontros, unir novamente as famílias, devolver a esperança.
Por tudo isso que viveu em curto espaço de tempo nas enchentes, o bombeiro salienta que a cada salvamento, “a gente percebe o quanto é importante estar perto dos filhos. Sou grato por ter saúde, ter força, ser o herói para minha filha e tantas outras famílias que ajudei a resgatar. O bombeiro não busca medalha, mérito ou reconhecimento, tem a empatia de se colocar no lugar do outro e salvar”, declara.
Um pai que salvou a filha, um filho que salvou o pai
Não é à toa que Luiza fez o pai no desenho de super-herói. Há cerca de cinco anos, justamente num Dia dos Pais, em Rio Pardo, Luiza teve uma queda de cavalo, ficou desacordada. Entre o desespero de ver a filha imóvel no chão e a frieza em socorrer com todo o conhecimento que havia adquirido, ele mais uma vez deixou de lado a emoção. Foi rapidamente ao hospital com a filha nos braços anunciado parada cardiorrespiratória. Quando a menina voltou a si, olhou para o pai e perguntou se iria morrer. Não, não iria acontecer com ela.
Só que o choque com tal experiência fez com que Jhonatan não conseguisse dormir por dois dias e ele passou a dedicar aquele tempo a escrever uma longa carta, descrevendo tudo o que havia passado e sentido. Quando a filha completar 15 anos, irá recebê-la. E se essa experiência não bastasse, Jhonatan também já salvou seu pai, Jorge, de um afogamento no mar. O bombeiro traduz em amor a ação que mais sabe executar: resgatar.
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