Planos do Vale do Rio Pardo parecem ser simples cópias de modelos de grandes cidades
Com as novas administrações completando o primeiro mês de trabalho nos municípios da região, os projetos antes previstos no plano de governo — documento apresentado à Justiça Eleitoral no momento da inscrição da candidatura — ganham corpo e começam a sair do papel. No entanto, acima desse planejamento, existe outro instrumento que parece ser negligenciado por muitos municípios da região. A CF/88 deu aos entes locais um papel central na política de desenvolvimento urbano, com o Plano Diretor colocado com um instrumento para essa política e elaboração obrigatória para municípios com mais de vinte mil habitantes.
Dos 23 municípios que compõem o Conselho Regional de Desenvolvimento do Vale do Rio Pardo, sete são legalmente obrigados a possuir devido à sua população o documento que tem como principal objetivo definir a função social da cidade e garantir o acesso equitativo à terra urbanizada e o direito à moradia e aos serviços urbanos. No entanto, outros seis decidiram adotar voluntariamente, mesmo em uma região predominantemente rural, conforme a classificação de densidade demográfica utilizada pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico e pela União Europeia.
A OCDE define unidades administrativas como urbanas ou rurais com base na densidade populacional e classifica como rurais quando possuem menos de 150 habitantes por quilômetro quadrado. Mesmo o maior município da região, Santa Cruz apresenta uma densidade demográfica de 181,54 habitantes por quilômetro quadrado. Esse dado evidencia um problema recorrente – a desconexão entre os instrumentos de planejamento territorial e a realidade dos territórios. Muitas vezes, os planos não conseguem captar a complexidade e as especificidades de cada região, sobretudo quando são elaborados com base em modelos urbanos predominantes e desconsideram as particularidades locais.
A desconexão entre a realidade e as ferramentas de planejamento pode ser demonstrada no Vale do Rio Pardo. O Estatuto da Cidade apresenta alguns instrumentos jurídicos de política urbana que podem ser adotados pelos munícipios. Dos 13 municípios da região que possuem planos diretores, cinco adotaram a outorga onerosa do direito de construir, também conhecida como solo criado. Esse mecanismo permite que o município conceda a particulares o direito de construir acima dos limites estabelecidos pela legislação municipal, mediante contrapartida financeira. A ideia é que parte da valorização gerada por essa permissão retorne à coletividade, financiando melhorias urbanas e serviços públicos.
O número de municípios que adotam operações urbanas consorciadas é equivalente ao dos que adotam a outorga onerosa. Essas operações consistem em um conjunto coordenado de intervenções promovidas pelo poder público, em colaboração com proprietários, moradores, usuários e investidores privados. Exemplos, como o Porto Maravilha, no Rio de Janeiro, e a Água Espraiada, em São Paulo, geram debates sobre os reais impactos e beneficiários. Há questionamentos se essas intervenções não seriam empreendimentos imobiliários que reforçam a segregação socioespacial.
Muitos desses planos do Vale do Rio Pardo parecem ser simples cópias de modelos de grandes cidades e consideram as especificidades territoriais. Por exemplo, a previsão de operação urbana consorciada em pequenos municípios da região é questionável, dado o baixo interesse do mercado e da população nesse tipo de intervenção. A eficácia dos planos diretores está diretamente ligada ao processo de elaboração, que deve considerar as condições específicas de cada município. A adoção de modelos padronizados, sem adaptação à realidade local, compromete seu potencial de desenvolvimento e inclusão social.
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