Colunista

Ronan Mairesse

Atitude e negócios

Em meio ao caos

Publicado em: 10 de maio de 2024 às 15:18
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Nesta semana, o colunista Ronan não escreveu, como de costume, a coluna para falar de negócios e liderança. Em relatos, ele conta o que está sendo viver o caos.

“Na quinta de noite a minha família evacuou a casa e eu fiquei acreditando que a água não ia chegar, porque eu estou a quilômetros e quilômetros do rio, eu estou praticamente no centro da cidade. A partir das 5h da manhã a água chegou e até as 10h ela já estava um metro e já perto do meio-dia, um metro e meio, quase dois e o desespero começou a bater. O carro do meu pai submerso e eu estava no segundo piso, até que meu irmão veio, conseguiu barco e nos resgatou. Saí de casa somente com meu notebook e uma mala.

Na minha casa chegou a cinco metros de água, está um metro e meio acima do segundo piso, perdemos praticamente tudo, algumas coisas de valor eu botei em cima do roupeiro em cima. Fui logo falar com a Daiane (esposa), que está num abrigo da igreja. E já caí na água, começando a ajudar as pessoas, comecei a divulgar no Instagram, começaram a entrar as doações, somente ontem a gente distribuiu mil litros de combustível, mais 200 litros de óleo dois tempos. Começamos a pedir, a ir atrás de bateria, pilha para lanternas, então ontem a gente distribuiu combustível e lanternas.

A situação é dramática. Muitas dezenas de corpos boiando, principalmente crianças. As pessoas morreram de hipotermia. Porque a água estava muito gelada, eu digo hipotermia porque eu tive que cair na água e eu senti o quanto ela tava gelada, por exemplo, na madrugada, porque um dos meus cachorros caiu na água e afundou e eu tive que ir lá buscar ele. Deve ter sido hipotermia.

Um barco com dez crianças bateu e virou. O barqueiro e as dez crianças morreram. Os assaltos estão direto, estão roubando, roubaram os barcos, roubaram jet skis, jet skis para roubar as casas. Então agora os barqueiros, principalmente à noite, alguns durante o dia só saem se tiver um barco junto. A cena é de terror, a cena é de guerra. Eu comparo o que eu estou vendo aqui com 11 de setembro. Então, dadas as proporções, aqui nós vamos ter um problema 10 vezes, 15 vezes, talvez 20 vezes pior que Brumadinho em termos de vidas humanas.

Mas dentro de nós tem um gene da superação, que ele foi esquecido, principalmente depois da época das cavernas, quando a gente aprendeu a plantar e criar os bichinhos. Então antes nós enfrentávamos leões, nós enfrentávamos onças, enfrentávamos tudo para poder comer. E a gente desaprendeu isso, mas o ser humano, ele consegue superar. Lógico, é um trauma, é duro, vão ter pessoas que, por exemplo, que no momento que escutar uma chuva vão sofrer, por causa do trauma todo que foi, mas a gente consegue superar, sim.

Eu vou falar por Canoas e São Leopoldo, Esteio e Sapucaia, que são as cidades aqui que eu estou próximo, que os grandes heróis de tudo que está acontecendo, em primeiro lugar, são os barqueiros. Os barqueiros, eles foram incríveis, junto com os bombeiros e as forças de segurança. Mas se tu fores me dizer assim, quem é que é o herói? Os barqueiros. E o barqueiro é o povo”.