Reportagem

“Sofrimento não diminui, só aumenta”, diz mãe de bebê que morreu em creche

Publicado em: 19 de fevereiro de 2025 às 14:30
  • Por
    Cristiano Silva
  • Para Dayra, só restaram as fotos com a bebê | Foto: Arquivo pessoal
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    Dayra Martins desabafou sobre caso ocorrido em Santa Cruz, que completa um ano e meio no próximo dia 12 e ainda não teve desfecho

    Para Dayra Eduarda Martins da Silveira, 22 anos, o sentimento é de acordar todos os dias e ainda estar em 12 de setembro de 2023. Aquele fim de tarde de terça-feira, que parecia mais um dia qualquer, mudou sua vida para sempre.

    A filha, Lara Martins Anton, de cinco meses, morreu após engasgar com leite em uma creche particular na região central de Santa Cruz do Sul. O caso teve grande repercussão na comunidade e alertou o poder público e as forças de segurança para a fiscalização nos estabelecimentos que cuidam dos pequenos.

    Tanto que uma semana depois, vereadores aprovariam a indicação para tornar obrigatório o ensino da Manobra de Heimlich em escolas e creches do município. Um inquérito foi instaurado para apurar as circunstâncias da morte, mas o caso, que completa um ano e meio no próximo dia 12, ainda não foi finalizado.

    Em entrevista exclusiva ao Portal Arauto, a mãe da bebê Lara desabafou e contou os problemas que ela e as pessoas próximas vêm passando desde então. “O sofrimento não diminui, só aumenta”, disse ela. Conforme Dayra, o fato provocou desdobramentos familiares irreversíveis.

    Depois de um tempo, ela encerrou o relacionamento com o pai de Lara. “Cada um foi viver o seu luto, e isso é compreensível, é algo que acaba com qualquer um. Cada um foi seguir sua vida”, relatou. Segundo Dayra, carrinho e banheira da bebê foram doadas, mas algumas roupinhas de Lara foram guardadas.

    “Nada vai trazer ela de volta, e era tudo que eu queria. Eu não lembro mais do cheiro da minha filha, não lembro do rostinho dela a não ser olhando foto ou vídeo. A única coisa que peço é justiça”, enfatizou a mãe da bebê.

    Conforme a mulher de 22 anos, o primeiro ano foi difícil. “Sofremos muito todos os dias. Estamos tentando no reerguer, mas não é fácil. Ninguém nota, porque temos que estar ali todos os dias, sorrindo para todo mundo”, disse ela.

    “As pessoas perguntam como está o caso e eu não consigo responder. Acho um absurdo uma criança ter morrido dentro de uma creche e não ter uma resposta depois desse tempo todo. Eu quero justiça, porque não foi fatalidade, foi negliência”, finalizou.

    O caso segue em investigação com a Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA). A delegada Raquel Schneider confirmou à reportagem da Arauto que perícias complementares, solicitadas ao Instituto-Geral de Perícias (IGP) de Porto Alegre, retornaram recentemente, e o inquérito do caso deve ser concluído em breve.

    Relembre o caso

    Segundo o que a polícia divulgou na época do fato, a monitora titular da sala da creche onde Lara estava teria dado a mamadeira para ela, que chegou a brincar depois no chão. A bebê, então, adormeceu na cadeirinha de descanso e foi colocada no berço.

    A morte teria acontecido quase uma hora depois de ela ter mamado. A monitora titular estava trocando outra bebê, e uma mulher que trabalha no local fazendo serviços passou e percebeu que Lara estava um pouco pálida. Ela pegou a menina e começou a realizar manobras de reanimação.

    Saiu da sala pedindo ajuda e outra monitora, de outra turma, pegou a criança e também fez manobras, enquanto a titular da sala ligou para os bombeiros e outra para o Samu. Ainda conforme a polícia, a diretora também teria tentado prestar socorro fazendo massagem cardíaca, e a bebê teria expelido bastante leite.

    Os bombeiros foram primeiro à creche e fizeram tentativas de reanimação. Depois o Samu chegou e entubou a criança, para levá-la ao Hospital Santa Cruz (HSC). Na casa de saúde foram realizadas outras manobras de reanimação, sem sucesso.

    Então, os médicos realizaram uma aspiração tubo orotraqueal, onde foi constatada secreção com característica de leite em grande quantidade. A bebê não resistiu e faleceu. A diretora do estabelecimento de ensino, uma mulher que realizava serviços gerais e duas monitoras prestaram depoimento.

    A polícia verificou que a creche não possuía sistema interno de câmeras nas salas, o que não é obrigatório. As únicas gravações são da entrada do estabelecimento e do entorno na rua. Todas as monitoras que prestaram o socorro inicial tinham curso atualizado da Lei Lucas. O nome da creche jamais foi revelado pelas autoridades.

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